MONISMO JURÍDICO: ENTRAVE ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DOS POVOS INDÍGENAS
JURIDICAL MONISM: STATE IMPEDIMENT TO THE EFFECTIVENESS OF HUMAN RIGHTS OF INDIGENOUS PEOPLES
Alessandra Matos PortelaI
I Universidade de Tiradentes (UNIT), Aracaju, SE, Brasil. (Doutora em Direito). E-mail: aleportella@hotmail.com
Sumário: Introdução. 1 Quem são os Índios para o Ordenamento Jurídico Pátrio. 2 Tratamento Jurídico dos Povos Indígenas no Direito Brasileiro. 3 Tratamento Jurídico dos Povos Indígenas no Direito Latino-Americano e no Direito Internacional. 4 Monismo Estatal e o Problema do Reconhecimento dos Sistemas Jurídicos Indígenas. Conclusão. Referências.
Resumo: O Estado brasileiro, desde os primórdios, nunca se preocupou com os direitos dos povos indígenas. A mudança de paradigma nesta questão só começou a ser alterada no início do século XX, mais precisamente em 1910, quando foi assinado o Decreto 8.072, criando o Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais (SPILTN), transformado em 1918 no Serviço de Proteção ao Índio (SPI). A cidadania indígena, contudo, nunca fora reconhecida. A mudança teve início apenas a partir da Constituição Federal de 1988, a qual dedicou um capítulo exclusivo para tutelar os direitos dos povos indígenas. A partir desse marco legal, o Brasil assinou e ratificou decretos importantes no âmbito internacional, que ampliaram os direitos desses povos com vistas a dar-lhes dignidade. Porém, ainda hoje o Brasil se nega a reconhecer a organização social ameríndia, seus sistemas jurídicos e suas sociedades como autônomas, uma vez que adota em sua matriz jurídico-constitucional o monismo jurídico.
Palavras-chave: Direitos dos Povos Indígenas. Cidadania Indígena. Dignidade. Monismo Jurídico.
Abstract: The Brazilian State, from its earliest days, never cared about the rights of indigenous peoples. The paradigm shift in this issue only began to change at the beginning of the 20th century, more precisely in 1910, when Decree 8,072 was signed, creating the Service of Protection to Indians and Localization of National Workers (SPILTN), transformed in 1918 into the Service of Protection to the Indian (SPI). Indigenous citizenship, however, had never been recognized. The change began only after the Federal Constitution of 1988, which dedicated an exclusive chapter to protect the rights of indigenous peoples. From this legal landmark, Brazil signed and ratified important decrees at international level, which extended the rights of these peoples with sight to giving them dignity. However, even today, Brazil refuses to recognize Amerindian social organization, its legal systems and its societies as autonomous, since it adopts juridical monism in its legal-constitutional matrix.
Keywords: Rights of Indigenous Peoples. Indigenous Citizenship. Dignity. Juridical Monism.
1 INTRODUÇÃO
É curial o ostracismo vivido pelos povos indígenas no território brasileiro desde o seu descobrimento pelos europeus. Considerados como selvagens, foram relegados à condição de incapazes e despossuídos de direitos, sendo as políticas públicas destinadas a esses agrupamentos humanos consideradas como uma graça, um favor, tutelados quase em grau de misericórdia.
Cidadania indígena era algo que não se mencionava, afinal, os índios enquanto incapazes e inimputáveis não podiam ser considerados cidadãos, possuidores de direitos e prerrogativas frente ao Estado brasileiro. A política destinada a eles era de cunho integracionista, sendo classificados segundo o nível de interação com a “comunhão nacional”, variando de isolados, leia-se sem integração alguma, até integrados, quando partícipes dos valores morais, tradições, usos e costumes da sociedade dos ditos civilizados, havendo um meio termo entre essas categorias denominadas de “em integração”, consoante disposto no art. 4º do Estatuto do Índio, ainda em vigor no Estado heterogêneo, multifacetado e plural como o brasileiro.
Essa situação discriminatória só veio a ser modificada, ao menos, em tese, no final do século passado, quando minorias étnicas, religiosas, de origem, raça, cor, gênero começaram a reivindicar seus lugares de direito no Estado multicultural e multiétnico brasileiro. Políticas públicas começaram a ser criadas para esses grupos de excluídos, sendo a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 indubitavelmente um marco histórico nesse sentido.
O maior entrave, entretanto, hodiernamente, continua sendo a matriz constitucional do monismo jurídico adotado pelo ordenamento jurídico pátrio. Isso porque impede o reconhecimento da soberania das nações indígenas em território nacional, apesar de as mesmas serem, de fato, sociedades à parte, constituídas por cosmologias díspares, dissonantes do resto da comunidade nacional. Seus sistemas de valores, normativos, tradições, línguas, usos e costumes destoam substancialmente da denominada “comunhão nacional”.
O monismo jurídico acaba sendo, nesse diapasão, um entrave à concretização dos direitos fundamentais dos povos indígenas no território brasileiro, atentando contra a dignidade dessas nações, que ficam impossibilitadas de exercer os seus direitos individuais e coletivos de forma plena e autônoma, como previstos em normas e diplomas internacionais.
1 QUEM SÃO OS ÍNDIOS PARA O ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO
O conceito de índio não é pacífico de entendimento entre os membros da comunidade nacional. O imaginário popular ainda se encontra arraigado a conceitos construídos no período colonial, vendo-os como seres primitivos e inferiores.
A designação de índio, para a comunidade nacional, continua sendo, até o presente momento, a mesma de quando Cristóvão Colombo chegou à ilha de São Salvador, nas Bahamas, ou seja, definida e determinada por impregnação visual e genética, “[...] de modo que não poderia ser índio quem não fosse razoavelmente escuro-avermelhado, não tivesse cabelos negros e lisos, olhos levemente puxados e, se possível, com muita tinta no rosto e pouca roupa no corpo” (PONTES, 2012, p. 168).
Consoante Manuela Carneiro da Cunha, citada por Barreto (2011, p. 36): “Nosso imaginário – e, por que não dizer, nosso entendimento – está repleto desta correlação: índio é aquele ser que vive na selva, anda nu, é feroz, primitivo [...] ou, ao contrário, está em um museu vivo, é o “bom selvagem”.
O legislador brasileiro, por sua vez, designou como índio ou silvícola: “Todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional” (Lei 6.001/73, art. 3º inc. I).
Nesse sentido, a Lei 6.001/73 confundiu índio e silvícola, como preleciona Manuela Carneiro da Cunha, citada por Barreto (2011, p. 36), “como se todo índio fosse habitante da selva, desconsiderando a possibilidade, se não o fato, de que existem índios sobrevivendo nas periferias das pequenas e grandes cidades”.
Pontes (2012, p. 169) afirma que o legislador brasileiro levou em consideração três critérios para definir o índio, quais sejam: “a) autoconsideração (“que se identifica”); b) consideração da sociedade (“e é identificado”); e c) hereditariedade (“de origem e ascendência pré-colombiana)”. O critério da hereditariedade, entretanto, não se encontra de acordo com a teoria antropológica moderna, que aponta como melhor critério de conceituação de “ser índio”, o de autoidentificação étnica (PONTES, 2012, p. 169).
O critério de hereditariedade também não encontra consonância com a prescrição normativa da Constituição brasileira de 1988, que protege o sentimento indígena, como mostram os antropólogos. Consoante aduz Pontes (2012, p. 170): “O espírito constitucional está permeado de infrangível consideração aos aspectos culturais do povo indígena, [...] há uma notória consideração com o exercício atual das tradições e culturas históricas dos índios como forma de incluí-las na conjuntura cultural brasileira”.
Visto por outro prisma, Barreto (2011, p. 33), analisando o art. 3º, inc. I, da Lei 6.001/73, entendeu que os três critérios adotados na definição de índio, foram os seguintes:
Genealógico, quando se refere à “origem e ascendência pré-colombiana”; cultural, ao mencionar as “características culturais [que] o distinguem da sociedade nacional”; e, por fim, pertença étnica, na expressão “que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico”.
O critério cultural, da mesma maneira que o critério genealógico (hereditário), não encontra guarida na visão antropológica moderna nem na Carta Magna brasileira, pois, consoante preleciona Manuela Carneiro da Cunha, citada por Barreto (2011, p. 36), “traços culturais podem variar no tempo e no espaço, como de fato variam, sem que isto afete a identidade do grupo”. Dessa forma, o que se deve levar em consideração na conceituação do índio é apenas e tão somente o critério de autoidentificação étnica, o seu sentimento de pertença a um determinado grupo indígena, bem como o sentimento desse grupo para com esse indivíduo que se sente e se autodenomina índio.
Seguindo essa premissa, o Estatuto da Sociedade Indígena, Projeto de Lei 2.057/91, já prevê o conceito de índio em seu art. 92 sem o critério da vinculação hereditária e cultural, entendendo que “índio é todo indivíduo que se identifica como pertencente a uma sociedade indígena e é por ela reconhecido como tal”, não importando
se o indivíduo tem origem indígena, se é ancestral dos povos pré-colombianos, pois o que importa é saber se aquele indivíduo se identifica e é considerado pelo meio que o circunda como um verdadeiro índio, como um verdadeiro perpetuador da cultura autóctone no vasto caldo cultural brasileiro, porque é isso que a Constituição quer preservar (PONTES, 2012, p. 171).
A proposta presente no Projeto de Lei 2057/91 encontra-se em perfeita harmonia com a antropologia contemporânea, como ensina Barreto (2011, p. 34), “a qual elimina critérios raciais, inaceitáveis e realça a continuidade histórica e a autoidentificação como definidoras da etnia”.
2 TRATAMENTO JURÍDICO DOS POVOS INDÍGENAS NO DIREITO BRASILEIRO
Santos Filho (2012, p. 18) afirma que “a legislação indigenista brasileira se inclinou sempre pela exclusiva defesa dos interesses dos colonizadores sem preocupação ou respeito com a cultura dos índios que já habitavam as terras”. Do mesmo modo Souza (2008, p. 1-2) afirma que o Estado brasileiro sempre pautou sua relação com os povos indígenas muito mais pela negação do que pelo reconhecimento de seus direitos, já que possuía interesse pelas terras que hoje ocupa aliada à concepção ideológica etnocentrista a respeito dos povos considerados primitivos, levando o Estado a apostar na extinção dessas populações.
A Constituição Republicana de 1891, assim como a Constituição do Império, não continham nenhuma previsão legal sobre os direitos indígenas. Apenas em 1910 foi editado o Decreto 8.072, criando o Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais, transformado em 1918 no Serviço de Proteção ao Índio (SANTOS FILHO, 2012, p. 18). O Decreto 8.072
previa a demarcação das terras ocupadas pelos índios, que delas teriam usufruto exclusivo; estabelecia a colocação em prática de meios mais eficazes para evitar que civilizados invadissem terras de índios e reciprocamente; preconizava o respeito à organização interna das tribos, seus hábitos e instituições, e a promoção, sempre que possível, da restituição dos terrenos ocupados” (SANTOS FILHO, 2012, p. 37).
Em 1916, foi aprovado o Código Civil, que previa em seu art. 6º a relativa capacidade dos índios para a prática de atos da vida civil e, em 1928, foi editado o Decreto 5.484, que regulava a situação dos índios nascidos em território nacional, com cinquenta artigos (SANTOS FILHO, 2012, p. 38).
Foi apenas a Constituição de 1934 “que tratou dos direitos dos povos indígenas, assegurando aos índios a posse de seus territórios, atribuindo à União a responsabilidade pela promoção da política indigenista”, previsão esta mantida pelas Constituições de 1937 e 1946 (SANTOS FILHO, 2012, p. 40). Em 1961 foi criado o Parque Nacional do Xingu, no governo do Presidente Jânio Quadros, tendo por fundamento a preservação das condições em que viviam diversos povos indígenas da Região do Xingu, incluindo o seu meio ambiente (ARAÚJO, 2006, p. 28).
A Constituição de 1967, além de reconhecer a posse das terras que habitavam aos silvícolas, também previu o direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades neles existentes. Foi também no ano de 1967 que foi editada a Lei nº 5.371, a qual substituiu o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) pela FUNAI – Fundação Nacional do Índio, tendo por finalidade “aplicar a política em prol do índio no território nacional; zelar pelo patrimônio indígena; fomentar estudos sobre populações indígenas que vivem em território brasileiro e garantir sua proteção; demarcar, assegurar e proteger as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” (SANTOS FILHO, 2012, p. 43).
Araújo (2006, p. 31) afirma que
a FUNAI ergueu-se sobre os escombros do SPI, aproveitando inclusive a sua estrutura de pessoal, recursos etc. [...] Se algo de novo havia, quando aparecia, vinha na forma de funcionários sem nenhuma experiência de trabalho com os índios, provenientes de outros órgãos que, funcionando em Brasília, estavam sendo transferidos para outras partes do país.
O SPI foi extinto porque “enfrentou uma avalanche de denúncias sobre irregularidades administrativas, corrupção, gestão fraudulenta do patrimônio indígena, em especial dos recursos naturais das terras indígenas” (ARAÚJO, 2006, p. 31).
Em 1973 foi editada a Lei nº 6.001,
conhecida como Estatuto do Índio, disciplinando as relações do Estado e da sociedade civil brasileira com os índios. Constituída por sessenta e oito artigos, divididos em sete títulos, essa lei regula a situação jurídica dos índios e das comunidades indígenas, com o propósito de preservar a sua cultura e “integrá-los”, progressiva e harmoniosamente, à comunhão nacional (art.1º) (SANTOS FILHO, 2012, p. 44).
O Estatuto do Índio possui o mesmo princípio contido no Código Civil de 1916, classificando os índios como relativamente incapazes, devendo ser tutelados pelo órgão indigenista estatal que, de 1910 a 1967 era representado pelo Serviço de Proteção ao Índio – e, atualmente, é pela Fundação Nacional do Índio. A tutela só cessa quando houver a integração dos indígenas à sociedade nacional (ESTEVES, 2012, p. 17). Como preleciona Araújo (2006, p. 32), era objetivo desse Estatuto fazer com que eles gradativamente “deixassem de ser índios. Tratava-se, portanto, de uma lei cujos destinatários eram como `sujeitos em trânsito`, portadores, por isso mesmo, de direitos temporários, compatíveis com a sua condição e que durariam apenas e enquanto perdurasse essa mesma condição”.
Silveira (2011, p. 55) adverte que “a capacidade relativa do índio é, também, um reflexo das ideias positivistas, pois, pela Lei dos Três Estados de Auguste Comte, os índios estariam em um estágio inicial da escala civilizatória e não teriam discernimento completo para responderem, por si próprios, perante os atos da vida civil”.
O marco do direito constitucional indígena se deu apenas de 1988 com a Constituição cidadã, possuindo “um Capítulo composto de previsões concernentes aos índios onde foram delineados os contornos de como devem ser efetivadas as relações entre os índios, seus povos e o Estado brasileiro” (SANTOS FILHO, 2012, p. 45). Preleciona esse autor (2012, p. 46) que a Constituição de 1988 é considerada um marco para os povos indígenas porque cria uma postura inovadora no ordenamento jurídico pátrio, abandonando uma política de perspectiva assimilacionista e reconhecendo aos índios o direito à diferença, tornando explícita a multietnicidade e multiculturalidade brasileira.
Do mesmo modo aduz Scotti (2013, p. 491-492), reconhecendo que apenas a partir da “Constituição Cidadã” de 1988
o patrimônio cultural passou a ser considerado um direito dos povos indígenas e de toda a sociedade brasileira, não uma situação transitória, vestígio do passado a exigir superação pela modernização, mas uma garantia do multiculturalismo e um elemento central para a autocompreensão ética e nacional.
Santos Filho (2012, p. 46), citando Paulo de Bessa Antunes, ensina: “Reconhecer aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, o art. 231 alberga o direito à alteridade, ou seja, o direito de o índio ser diferente, o que implica a aceitação de que a cultura dos não-índios não é a única forma de cultura válida”.
Em razão dessa nova orientação, afirma Santos Filho (2012, p. 47), citando Orlando Vilas Boas Filho, “as populações indígenas deixam de ser encaradas a partir de sua futura integração à sociedade brasileira, e sim, a partir de si próprias, de modo a ganhar visibilidade”. Como aduz Silveira (2011, p. 58), “é a Carta cidadã que, finalmente, põe um fim na categorização entre índios isolados e índios integrados, superando, definitivamente, as distinções impostas pelo Estatuto do Índio e valorizando a diversidade cultural brasileira”.
O paradigma da integração foi abandonado pela Constituição de 1988 e, em seu lugar, foi erguido o paradigma da interação, cujo fundamento é precisamente a diferença (BARRETO, 2011, p. 42). Em face desse novo contexto político-jurídico, Santos Filho (2012, p. 48) preleciona que “os dispositivos do Estatuto do Índio, Lei 6.001/73, forjados sob a óptica assimilacionista, [...] não foram recepcionados pelo novo sistema constitucional implantado a partir de 1988”.
Do mesmo modo assevera Roweder (2010, p. 219) afirmando que a Constituição Federal de 1988 “revogou, tacitamente, alguns artigos da Lei nº 6.001/73, principalmente no que os destituía da condição de povos etnicamente diferenciados”. Outra novidade relevante trazida pela Carta Magna brasileira de 1988 foi “a consagração do princípio de que as comunidades indígenas constituem-se em sujeitos coletivos de direitos coletivos” (SILVEIRA, 2011, p. 59).
Nesse diapasão, “a “cidadania indígena” é uma “cidadania plural”, que abarca não apenas os direitos e garantias fundamentais de cada índio, mas os direitos comuns de toda a comunidade indígena” (SILVEIRA, 2011, p. 60).
Sob a égide da Constituição Federal de 1988, diversos diplomas legais relacionados aos índios foram editados, merecendo destaque o Decreto 22 de 04.02.1991; os Decretos 23, 24, 25 e 26 de 04.02.1991; o Decreto 1.141 de 19.05.1994; o Decreto 1.775 de 08.01.1996 (revogou o Decreto 22 de 04.02.1991); o Decreto 3.108 de 30.06.1999; o Decreto 3.156 de 27.08.1999; a Lei 9.838 de 23.11.1999 e o Decreto 4.412 de 07.10.2012, todos em harmonia com a Constituição Cidadã (SANTOS FILHO, 2012, p. 53-54).
O reconhecimento à diferença imposta pela Constituição de 1988 não se confunde com incapacidade; pelo contrário, “reconhece a “capacidade” do índio para ingressar em juízo na defesa de seus direitos, sem depender da intermediação” (BARRETO, 2011, p. 43). Do mesmo modo o novo Código Civil brasileiro de 2002, que alterou o art. 6º do Código Civil de 1916, prevê em seu art. 4º, parágrafo único, “que a capacidade dos índios será regulada por legislação especial, no momento o Estatuto do Índio, que deve ser aplicado no que não contrariar a Constituição de 1988 e a Convenção 169/OIT” (SANTOS FILHO, 2012, p. 54).
Barreto (2011, p. 40) afirma que o Código Civil de 2002 não representou apenas uma mudança de técnica legislativa, mas representou uma mudança substantiva na medida em que não tratou os índios como incapazes; reconheceu a capacidade dos índios, remetendo à legislação especial o dever de regulamentá-la de acordo com o novo paradigma posto pela Constituição de 1988.
Atualmente, existe o Projeto de Lei 2.057 de 1991, tramitando no Congresso Nacional, que dispõe sobre o Estatuto das Sociedades Indígenas, o qual “abandona “os critérios de indianidade” contidos no art. 4º do Estatuto do Índio. Apenas uma única vez (art. 7º) usa a expressão “índios isolados”, mas mesmo assim para garantir-lhes a “integridade física e cultural” e o “direito de permanecerem como tais” (BARRETO, 2011, p. 40).
Barreto (2011, p. 34) ensina que o Estatuto das Sociedades Indígenas traz novidades interessantes, dentre as quais cita os artigos 2º, 3º e 92, vejamos:
Art. 2º Sociedades indígenas são grupos socialmente organizados, compostos de uma ou mais comunidades, que se consideram distintos da sociedade envolvente e mantém vínculos históricos com sociedades pré-colombianas.
Art. 3º As sociedades indígenas têm personalidade jurídica de natureza pública de direito interno e sua existência legal independe de registro ou qualquer ato do Poder Público.
Art. 92 Índio é todo indivíduo que se identifica como pertencente a uma sociedade indígena e é por ela reconhecido como tal.
Citando João Pacheco Oliveira, Barreto (2011, p. 34), preleciona que as propostas do Estatuto da Sociedade Indígena coadunam com a antropologia contemporânea, uma vez que elimina critérios raciais inaceitáveis e realça a autoidentificação como definidora da etnia.
Ressalte-se que o Estatuto das Sociedades Indígenas se encontra em tramitação no Congresso Nacional há 26 anos sem, até o presente momento, ter sido aprovado e sancionado pelo Presidente da República, permanecendo em vigor o anacrônico Estatuto do Índio de 1973, em completa desarmonia com a Carta Magna de 1988, que impõe o paradigma da interação em detrimento do paradigma da integração.
3 TRATAMENTO JURÍDICO DOS POVOS INDÍGENAS NO DIREITO LATINO-AMERICANO E NO DIREITO INTERNACIONAL
Na segunda década do século XX, em países latino-americanos como Peru e México, com populações indígenas numerosas, foi marcada pela necessidade de se elaborar políticas estatais conhecidas como indigenistas, formadas por programas massivos de integração social, de saúde e educação para a população indígena (PAUL AMRY, 2006, p. 83). Isso porque as crises econômicas, políticas e sociais contribuíram para debilitar os regimes autoritários que imperaram nestes continentes, dando azo à abertura democrática e às reformas constitucionais nas quais participaram a sociedade civil, incluindo o movimento indígena (2006, p. 88).
O problema indígena foi redefinido como social e cultural em vez de racial, se distanciando das políticas de assimilação forçosa como a existente anteriormente. Cuidou-se de integrar o indígena com o cidadão, conservando os elementos de sua cultura que não prejudicassem sua integração (PAUL AMRY, 2006, p. 83). Como se sabe, por conta de uma antropologia evolucionista já ultrapassada, o índio era classificado de forma tripartite entre “selvagem”, “semicivilizado” e “civilizado”, não se aplicando aos selvagens os Códigos clássicos, uma vez que se acreditava que eles careciam de livre-arbítrio, base para a punibilidade, substituindo por isso a punibilidade pela perigosidade, próprio da ideologia da defesa social (2006, p. 85).
A mudança se deu apenas na década de 70, quando se mudou o viés teórico antropológico, passando a ser este relativista, defendendo a existência de uma pluralidade de culturas de mesmo valor, não podendo por esta razão serem julgadas sobre a base de esquemas de outra cultura. Esse novo marco teórico antropológico entendeu que o comportamento dos integrantes de cada cultura era condicionado pela cultura na qual viviam, consoante afirmado por Ruth Benedict, citada por Paul Amry (2006, p. 87).
Essa novel reorientação antropológica interferiu inclusive na jurisprudência dos países da América Latina, conforme citado por Paul Amry (2006, p. 87), considerando que “em 1970 a Corte Suprema da Colômbia [...] rechaçou a analogia entre indígenas e menores de idade ou retardados mentais, alegando que sua condição derivava de sua cultura, é dizer, de um fator exógeno, e não de uma normalidade psíquica”. Da mesma forma, aduz esse autor (2006, p. 87), que “a mesma orientação relativista informou posteriormente a elaboração dos projetos que antecederam o Código Penal peruano de 1991”.
Tais mudanças foram fruto do reconhecimento do pluralismo cultural, tendo sido reconhecida em meados da década de 80 a identidade cultural, levando na década de 90 ao reconhecimento do direito à jurisdição própria indígena (PAUL AMRY, 2006, p. 89).
Foi na década de 80 que passou a se discutir a necessidade de redefinir as relações entre os povos indígenas e o Estado, sendo encontradas nesse período referências aos direitos humanos como justificadores da política indigenista, assim como as implicações dessa problemática para o tema das autonomias étnicas (HOLANDA, 2008, p. 100-101).
Paul Amry (2006, p. 89) ensina que as reformas constitucionais interferiram diretamente no Direito Penal dos países da América Latina, pois “era contraditório reconhecer o direito à identidade cultural e seguir penalizando condutas que refletem esta identidade”. Dessa maneira, a inimputabilidade foi reavaliada pelos penalistas, uma vez que esse conceito era estigmatizante, como ensina Juan Bustos Ramírez, citado por Paul Amry (2006, p. 89), “pois diferenciava entre pessoas que dispõem de livre-arbítrio e outros que, por falta de capacidade, se encontram relegados à categoria de seres humanos incompletos que necessitam ser tutelados”. O Código Penal peruano de 1991, por exemplo, desprezou a proposta baseada na inimputabilidade, substituindo por outra aprovada sob o nome de “erro culturalmente condicionado” (PAUL AMRY, 2006, p. 89).
No âmbito do direito internacional se pode afirmar que o tratamento jurídico dos povos indígenas possui uma intrínseca relação com os direitos humanos, que ganharam expressão na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. A partir dessa Declaração, foi generalizada a preocupação de proteção dos direitos humanos no âmbito civil, político, econômico, social e cultural, refletindo um processo de evolução da humanidade, conhecido como dimensões de direitos fundamentais.
Os direitos humanos de primeira geração estabelecem regras de limitação ao Estado, afirmam a defesa dos indivíduos em face do poder soberano do Estado, proclamam os direitos civis e políticos do cidadão. Os direitos humanos de segunda geração, por sua vez, exigem uma prestação positiva do Estado, efetivando direitos econômicos, sociais e culturais e acentuando o princípio da igualdade (SANTOS FILHO, 2012, p. 56-57).
Já os direitos humanos de terceira geração são os que têm como titulares a coletividade (povo, família, nação, etnia), estando incluídos neles os direitos dos povos indígenas, que “relacionam-se com a proteção da dignidade humana, como a proteção ao meio ambiente, ao desenvolvimento, à paz e ao patrimônio comum da humanidade” (SANTOS FILHO, 2012, p. 57). Essas gerações de direitos humanos não se sucedem, mas interagem entre si. “Acolhem a ideia de expansão, cumulação e fortalecimento dos direitos humanos, todos essencialmente complementares e em constante dinâmica de interação” (PIOVESAN, 2006, p. 135).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, juntamente com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, formam a Carta Internacional dos Direitos Humanos (SANTOS FILHO, 2012, p. 62). O sistema global de proteção dos direitos humanos é inaugurado a partir dessa Carta Internacional de Direitos Humanos que, ao lado do sistema regional de proteção dos direitos humanos já existente – nos âmbitos europeu, americano e posteriormente africano – forma a estrutura normativa de proteção internacional dos direitos humanos (PIOVESAN, 2006, p. 152).
O sistema global e os sistemas regionais de proteção dos direitos humanos são complementares, “na medida em que o sistema especial de proteção é voltado, fundamentalmente, à prevenção da discriminação ou à proteção de pessoas ou grupos de pessoas particularmente vulneráveis, que merecem tutela especial” (PIOVESAN, 2006, p. 178). Santos Filho (2012, p. 69) afirma que “é expressivo o número de instrumentos internacionais específicos de direitos humanos ligados diretamente aos índios”, sendo o primeiro deles datado de 1957, momento em que foi editada a Convenção 107 da OIT – Organização Internacional do Trabalho, a qual se relacionava com a proteção das populações indígenas e outras populações tribais de países independentes. Essa Convenção 107 da OIT foi aprovada no Brasil pelo Decreto 20 de 1965 e promulgada pelo Decreto 58.824, de 1966, porém, “com a evolução da mentalidade sobre a causa indígena, a Convenção 107/OIT, passou a sofrer fortes resistências, visto estar alicerçada na proposta de integração das populações indígenas na vida dos países” (SANTOS FILHO, 2012, p. 71).
Assim, em 1989, a Convenção 107/OIT foi revisada pela Convenção 169/OIT, “assegurando o direito de os povos indígenas viverem e se desenvolverem como povos diferenciados em conformidade com seus padrões próprios” (SANTOS FILHO, 2012, p. 71-72). A Convenção 169/OIT foi promulgada pelo Brasil pelo Decreto 5.051, de 2004, e é constituída por quarenta e três artigos distribuídos em dez seções e
define a política geral para o tratamento dos povos indígenas, obrigando os governos a assumirem a responsabilidade de desenvolver ação coordenada e sistemática com vistas a proteger os direitos desses povos e a garantir o respeito pela sua integridade (art. 2º), e garantir o gozo pleno dos direitos humanos e liberdades fundamentais, sem obstáculos nem discriminação (art. 3º) (SANTOS FILHO, 2012, p. 75).
Torres Romero (2009, p. 4) aduz que a Convenção 169 da OIT é um dos diplomas internacionais mais importantes sobre os direitos indígenas, ressaltando três artigos fundamentais, quais sejam: 8, 9 e 10, uma vez que “outorgam aos povos indígenas o direito de administrar sua justiça segundo suas próprias pautas culturais, invocam aos Estados a obrigação de respeitar suas próprias decisões”.
Além desses dois diplomas específicos relacionados aos índios – Convenção 107/OIT e Convenção 169/OIT – podem ser citados ainda outros:
Instrumentos integradores do sistema especial de proteção dos direitos humanos relacionados aos índios, tais como: a Convenção para prevenção e a repressão do crime de genocídio (ONU/1948); a Convenção relativa à luta contra discriminação no campo do ensino (UNESCO/1960), e a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial (ONU/1966) (SANTOS FILHO, 2012, p. 76).
Deve ser realçado, ainda, consoante Santos Filho (2012, p. 76-77), a Agenda 21 (ONU/1992), documento elaborado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano realizada no Rio de Janeiro em 1992, uma vez que “um capítulo inteiro desse documento foi dedicado para o reconhecimento e fortalecimento do papel das populações indígenas e suas comunidades”.
Importante também é a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, citada por Esteves (2012, p. 31), aprovada por unanimidade na Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 2001, por 185 países. Esse documento mostra a necessidade de reconhecimento da diversidade cultural para que possam existir reformulações nas políticas governamentais no tocante à inclusão social e participação da sociedade no âmbito civil e político.
Por fim, não pode deixar de ser citada a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada na Assembleia Geral da ONU, em 13 de setembro de 2007. Constitui um instrumento internacional que apresenta interesses tanto da ONU quanto dos povos indígenas, estabelecendo um modelo para o futuro com paz e justiça, fundada no respeito e reconhecimento mútuos (ESTEVES, 2012, p. 32-33). Esta Declaração é de capital importância para os povos indígenas porque “enfatiza os direitos indígenas de manter e reforçar suas próprias instituições, tradições e culturas seculares, além de promover o desenvolvimento de acordo com suas necessidades e aspirações” (ESTEVES, 2012, p. 33).
Ademais, aduz Esteves (2012, p. 33), “traz o compromisso dos Estados signatários para arcarem com medidas que ajudem a garantir que os povos indígenas tenham seus anseios e decisões sobre os assuntos pertinentes respeitados”.
A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas aborda os direitos individuais e coletivos como direitos culturais e de identidade, afirmando que os indígenas possuem o direito de manterem e desenvolverem seus próprios costumes, espiritualidade, tradições e práticas (ESTEVES, 2012, p. 33-34).
Rechaça peremptoriamente o paradigma assimalacionista, contido no anacrônico Estatuto do Índio, afirmando em seu art. 8º que “os povos e pessoas indígenas têm direito a não sofrer assimilação forçada ou a destruição de sua cultura” (DECLARAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE OS DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS, 2008).
Esteves (2012, p. 34) aponta ainda a importância dos arts. 18 e 19 dessa Declaração, os quais “enfatizam o direito de participação desses povos nas tomadas de decisões sobre questões que afetem seus direitos [...] e o dever do Estado de cooperar com boa-fé com os interessados”.
4 MONISMO ESTATAL E O PROBLEMA DO RECONHECIMENTO DOS SISTEMAS JURÍDICOS INDÍGENAS
A ideologia jurídica ocidental surge juntamente com os Estados modernos, dotando o conteúdo semântico do Direito de ideias como poder, coerção e controle e produzindo a crença de que o Estado é um elemento indispensável para garantir a ordem social. Consoante ensina Wolkmer (2001, p. 26),
o fenômeno jurídico que florescerá na moderna cultura europeia ocidental, a partir do século XVII e XVIII, corresponderá à visão de mundo predominante no âmbito da formação social burguesa, de modo de produção capitalista, da ideologia liberal-individualista e da centralização política, através da figura de um Estado Nacional Soberano.
“Tal concepção atribui ao Estado Moderno o monopólio exclusivo da produção das normas jurídicas, ou seja, o Estado é o único agente legitimado capaz de criar legalidade para enquadrar as formas de relações sociais que vão se impondo” (WOLKMER, 2001, p. 46). Nasce o monismo jurídico, “fortemente associada ao declínio do Feudalismo, aos interesses absolutistas da monarquia fortalecida e às novas necessidades de regulamentação centralizadora das práticas mercantis prevalecentes”. Esse é o que Wolkmer (2001, p. 51) denomina de primeiro ciclo do monismo jurídico. O segundo ciclo abarca o período da Revolução Francesa até o final das principais codificações do Século XIX. Durante esse período,
o Direito Estatal não será mais reflexo da vontade exclusiva de soberanos absolutistas, mas produto da rearticulação das novas condições advindas do Capitalismo concorrencial, da crescente produção industrial, da ascensão social da classe burguesa enriquecida e do liberalismo econômico, condições essas movidas pela lei do mercado, com a mínima intervenção estatal possível.
É nesse segundo ciclo que se verifica “a gradativa postulação e redução do Direito Estatal ao Direito Positivo, consagra-se a exegese que todo o Direito não só é Direito enquanto produção do Estado, mas, sobretudo, de que somente o Direito Positivo é verdadeiramente Direito” (WOLKMER, 2001, p. 55).
O terceiro ciclo do monismo jurídico é caracterizado por “uma legalidade dogmática com rígidas pretensões de cientificidade e que alcança seu apogeu dos anos 20/30 aos anos 50/60 deste século”. É nesse ciclo monístico que o Direito se impõe enquanto uma “Teoria Pura” kelseniana, “que o Estado é identificado com a ordem jurídica, ou seja, o Estado encarna o próprio Direito em determinado nível de ordenação, constituindo um todo único” (WOLKMER, 2001, p. 57).
Por fim, aduz Wolkmer, chega-se ao quarto e último ciclo do monismo jurídico situado a partir dos anos 60/70. Este período é marcado pelo “esgotamento do paradigma da legalidade que sustentou, por mais de três séculos, a modernidade burguês-capitalista”. Porém, a despeito da crise do modelo legalista caracterizada pela gradual perda de sua funcionalidade e de sua eficácia, “a variante estatal normativista resiste a qualquer tentativa de perder sua hegemonia, persistindo, dogmaticamente, na rígida estrutura lógico-formal de múltiplas formas institucionalizadas” (WOLKMER, 2001, p. 58-59).
Hodiernamente, portanto, ainda subsiste a ideologia do centralismo jurídico, da identificação do Estado com o Direito, da interdependência mútua entre esses dois entes político e jurídico, sem a qual se tornou inimaginável pensar em um sem o outro. Consoante ensina Santos (1988, p. 165), “o direito estatal continua a ser, no imaginário social, um direito central, um direito cuja centralidade, apesar de fortemente abalada, é ainda um fator político decisivo” e umas das consequências advindas disso é a falsa crença de que as sociedades tradicionais são sociedades sem Direito.
As sociedades primitivas são sociedades sem Estado, mas não sem Direito. Consoante ensina Barbosa (2001, p. 27), citando Shirley:
Muitas sociedades existiram e ainda existem sem quaisquer leis escritas, ou poder burocrático, ou violência organizada do Estado. Isto não significa que essas sociedades não tenham regras ou normas sociais, nem quer dizer que não há mecanismos de controle social ou sanções contra aqueles que infringem essas regras.
Apenas uma visão etnocêntrica pode sustentar que não se pode imaginar uma sociedade sem Estado e que o Estado é o destino de toda a sociedade, entendendo que “a história tem um sentido único, de que toda sociedade está condenada a inscrever-se nessa história e a percorrer as suas etapas que, a partir da selvageria, conduzem a civilização” (CLASTRES, 1974, p. 3). Esse autor adverte que tal divisão tipológica entre selvageria e civilização só se deu a partir do surgimento do Estado, que forneceu a toda a sociedade o seu elo lógico, traçando uma linha irreversível de descontinuidade entre as sociedades (1974, p. 12).
Essa visão distorcida e imposta pelos Estados modernos ocidentais se pautou na ideia de desenvolvimento ligado à produção material, notadamente a partir do século XIX em decorrência de um pensamento antropológico denominado de “evolucionismo unilinear”. A cultura, para essa corrente de pensamento, “desenvolve-se de maneira mais ou menos uniforme, sendo aceitável pressupor que cada sociedade percorresse as mesmas etapas evolutivas” (BARRETO, 2011, p. 35). Como aponta Curi (2012, p. 231), as teses antropológicas evolutivas
fundamentam suas teorias na ideia de que toda a humanidade atravessa sucessivamente, seguindo uma única direção, uma trajetória do simples para o complexo, do irracional para o racional, compreendendo três fases de desenvolvimento: a selvageria, a barbárie e, finalmente, a civilização.
Transposto essa ideologia para as sociedades indígenas, nasce a falsa percepção de que é preciso “civilizar os grupos de cosmovisão primitiva a partir de uma suposição básica de que a cultura moderna é superior à primitiva, baseando-se em ideias do darwinismo social que fundamentam o prevalecimento dos grupos fortes sobre os fracos” (BARBOSA, 2001, p. 24). O índio, nessa concepção, “é um ser “primitivo” e “em processo de evolução” para a condição de “civilizado” ou com os termos empregados pela legislação a caminho da integração à “comunidade nacional” (BARRETO, 2011, p. 36).
Holanda (2008, p. 99) ensina que “foi mediante o gradativo acúmulo de conhecimentos e práticas que o conceito de civilização tornou-se sinônimo de ação sobre os índios”. Transposto tal crença para o plano jurídico, a ideologia do desenvolvimento “consiste em considerar desenvolvidas as sociedades que adotaram as técnicas jurídicas ocidentais, onde as codificações são símbolos de desenvolvimento jurídico” (BARBOSA, 2001, p. 33).
Dessa forma, ensina Barbosa (2001, p. 36), citando Rouland, houve uma progressiva transferência no plano jurídico dos costumes para as leis, da vingança para a pena, “sendo considerada sanção civilizada pela existência de um aparelho especializado com a intervenção determinante de um terceiro [...] com bastante poder e na condição de representante da sociedade”.
Essa visão, entretanto, está bastante equivocada, como demonstra o estudo de campo de Malinowski (2015, p. 53), realizado ao noroeste da Melanésia em 1926. O Direito não se encontra imbrincado à existência de uma sanção oriunda de um poder central, mas é definido a partir de suas funções no campo das relações sociais, que “devem ser buscadas na concatenação das obrigações, no fato de elas serem organizadas em cadeias de serviços mútuos, numa reciprocidade que se estende sobre longos períodos de tempo e cobre amplos aspectos de interesse e atividade”.
A lei da sociedade “civilizada” encontra seu análogo na sociedade “primitiva” nos incentivos sociais e psicológicos complexos. Teleologicamente são iguais, uma vez que ocorre a submissão de seus membros no tocante ao comportamento esperado, diferenciando-se, entretanto, no aspecto formal, já que naquela a mensagem é transmitida de forma escrita, nesta a comunicação ocorre por meio das práticas sociais.
As práticas sociais dos povos indígenas caracterizam o seu direito como consuetudinário, sendo esse “um conjunto de normas sociais tradicionais, criadas espontaneamente pelo povo, não escritas e não codificadas” (CURI, 2012, p. 231). Curi citando Gayosso (2012, p. 236) afirma que
o direito costumeiro para os povos indígenas atende a uma cosmovisão fundada em princípios ancestrais que está relacionada com a ordem natural dos acontecimentos. São regras aceitas e aplicadas pela sociedade porque a consciência coletiva diz que são boas para os homens. Sua aplicação não requer a inclusão de tais regras em textos normativos, pois o que as tornam legítimas é a consciência comum do grupo que, por meio do conhecimento dos princípios gerais que regem as suas condutas, sustenta as regras determinadas para a resolução de problemas específicos.
A força vinculante do costume, consoante Losano (2007, p. 320),
fundamenta-se ou na sanção positiva da reciprocidade (com base na qual o sujeito aceitar adotar um certo comportamento porque a ele vincula uma obrigação de outro na qual está interessado), ou na sanção negativa, ou seja, na punição derivada de antepassados reverenciados ou de divindades temidas, ou seja, de seres sobrenaturais.
Villares (2012, p. 23) ensina que “o uso de retribuições e penas para determinadas condutas é constante, mas os pressupostos da pena prevista anteriormente e de algum procedimento formal para impingi-las não é regra”. Portanto, menciona Curi (2012, p. 235),
a afirmação de que os indígenas não têm lei, incutida no senso comum e na compreensão de juristas mais conservadores, é alimentada pela ideia de que a “primitividade” das relações sociais desses povos não comportaria as características do Direito. Uma concepção ultrapassada dentro da antropologia jurídica moderna.
É fato a existência do sistema jurídico indígena, é certo que ele existe, porém, de forma diversificada. Como ensina Souza (2008, p. 9),
os Direitos indígenas precisam ser compreendidos nos seus próprios termos, isto é, sem serem qualificados ou hierarquizados conforme o padrão do Direito estatal, considerados “não escritos”, “sem tribunais” (entres outras qualificadoras negativas) e, desse modo, “inferiores” ou “subsidiários” em relação ao Direito estatal.
São plúrimos os sistemas jurídicos indígenas e não uno, uma vez que os grupos indígenas existentes no território brasileiro são muito diversificados e diferenciados entre si, variando muito em função do contato que tem com a sociedade nacional. Conforme aduz Barbosa (2001, p. 22):
Há sociedades indígenas em contacto muito antigo com a sociedade brasileira, em condições de dependência quase absoluta, em todos os níveis de sua realidade – econômica, social, política e jurídica – e há sociedades indígenas ainda não contactadas; há, outrossim, extenso leque intermediário.
O certo é que todas as comunidades indígenas possuem o seu próprio regramento, podendo ser análogo ou não ao Direito estatal, a depender do grau de contato que o grupo indígena considerado guarda em relação à sociedade nacional.
Apesar dessa realidade, o Estado brasileiro adota a mesma legislação especial para regular toda essa diversidade cultural, “outorgando unilateralmente direitos genéricos através de sua própria lógica jurídica aos indivíduos e às próprias sociedades indígenas” (BARBOSA, 2001, p. 18). Entretanto, esta postura estatal não é a mais adequada como ensinam Silva e Machado (2014, p. 37), “uma vez que observando os padrões de uma população que não possui os mesmos critérios de criminalidade e moralidade, os mesmo não se sentiriam minimamente responsáveis pelas consequências do ato”.
Segato (2006, p. 211-212) explica que
a ideia de uma sociedade nacional como uma unidade de base étnica e com as características de uma comunidade moral prescreve continuidades entre a lei e o costume do grupo dominante para todos os habitantes de seu território, afirmando o parentesco entre o sistema legal e o sistema moral desse grupo particular e, portanto, entre o regime de contrato – no qual se baseia a ideia de Constituição e Jurisprudência – e o regime de status, assentado no costume.
A despeito desse fato, a legitimidade do Direito das comunidades indígenas mantém-se incólume, uma vez que são “via de regra, restritas ao seu próprio espaço territorial, político e social, elas serão sempre legítimas para os afetados por terem sido criadas e aplicadas por eles próprios” (BARBOSA, 2001, p. 20).
Consoante ensinam Yamada e Belloque (2012, p. 125): “Os sistemas de organização social indígena têm um valor intrínseco à cultura e moral dos povos indígenas, tal como o sistema de organização não indígena representa e se legitima para o não índio”.
Entretanto, apesar dessa suposta igualdade axiológica entre ambas as organizações sociais – indígena e não indígena –, Segato (2006, p. 211) preleciona que não existe o reconhecimento dos costumes indígenas por parte do Estado brasileiro como equivalente à lei positivada, pois
se afirmarmos que a norma moral tradicional vale tanto quanto a lei, estaremos no caminho do reconhecimento pleno da autonomia dos povos originários, mas nos distanciaremos, na maior parte dos casos, do que os instrumentos internacionais promulgam com relação aos direitos humanos da mulher e até, em alguns casos, das crianças, entre outras categorias marcadas por um status inferior e dependente.
Apesar disso, o direito de criar e aplicar suas próprias regras de conduta é extraído do princípio da autodeterminação dos povos indígenas, é um direito à coexistência pacífica no interior do Estado com o resto da população, tratando-se de uma descolonização interna.
Amparados pelo princípio da autodeterminação dos povos, não apenas podem como devem os povos indígenas viver no seu território sob o comando de seus regramentos, sob o manto de sua cultura, devendo ser reconhecida pelo Estado sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, consoante preconiza o art. 231 da Constituição da República Federativa do Brasil.
O Estado brasileiro, por adotar uma postura monista, não aceita o regramento indígena e entende que deve intervir em suas práticas culturais de modo a normatizar aquilo que para os índios já se encontram normatizados.
Os sistemas jurídicos indígenas, a despeito de existirem de fato, acabam sendo encobertos pela sociedade nacional que impõe o jugo de sua tutela ainda que isso represente uma violação dos direitos fundamentais indígenas, pois, como adverte Villares (2012, p. 24), “se o Direito ignora o pluralismo jurídico e a existência de formas indígenas próprias de resolução de suas ações e conflitos, é colocado em risco o direito individual do índio e o direito coletivo de todo um povo”.
5 CONCLUSÃO
O artigo ora apresentado busca provocar uma reflexão acerca do sistema jurídico adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro em sua matriz constitucional, com vistas a questionar a sua compatibilidade num país essencialmente multiétnico e multicultural como o Brasil.
Independentemente de haver reconhecimento formal dos sistemas jurídicos adotados pelas comunidades indígenas em seus territórios, fato inconteste é que eles existem e possuem eficácia para os povos dessas nações, sendo suas práxis advindas de suas crenças e tradições, construídas secularmente.
O pluralismo jurídico intraestatal, invisível aos olhos do Estado, marca sua presença em extenso espaço territorial brasileiro, como já demonstrado em estudos antropológicos apresentados no presente artigo, possuindo notabilidade e reconhecimento entre os membros das nações indígenas.
O problema ocorre apenas quando o Estado entende ser legítima a sua interferência nas organizações sociais das comunidades ameríndias, ditando regras contrárias muitas vezes aos valores, costumes e tradições desses povos, afrontando suas culturas a partir de imposições imperialistas. Esta ação estatal ocorre justamente por conta de o sistema jurídico adotado em sua matriz constitucional autorizar tal intervenção sob a égide do discurso da soberania, não questionando, igualmente, a soberania também existente das nações indígenas de se autodeterminarem em suas organizações sociais a partir de suas peculiares cosmologias, consoante positivado e defendido por tratados internacionais assinados e ratificados pelo Estado Brasileiro, a exemplo da Convenção 169 da OIT e da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.
Sob esse prisma se compreende que o monismo jurídico acaba sendo um entrave à efetivação dos direitos fundamentais dos povos indígenas, os quais indubitavelmente possuem carga axiológica bastante diferente daqueles propugnados pela visão ocidental eurocêntrica, sendo em sua maioria direitos coletivos em detrimento dos direitos individuais propugnados e defendidos em diplomas legais elaborados desde as Revoluções Francesa e Americana, tendo seu ápice com a proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 10 de dezembro de 1948.
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Recebido em: 31.05.2017
Aceito em: 05.09.2018
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
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ISSN: 2178-2466